sexta-feira, 29 de maio de 2015

ÌYÉ ORÒ – As Penas Sagradas e suas pinturas



   ÌYÉ ORÒ – As Penas Sagradas e suas pinturas



Ìkódíde, Agbè,
Àlùkò e Lékeléke 
as quatros penas sagradas 
de nossa religião.


Somente utilizadas dentro da ritualística e nunca como um simples adorno, são elementos primordiais e indispensáveis dentro dos ÌgbèrèRitos Iniciáticos e de Passagens de qualquer Divindade do Panteão Iorubá. Não existem penas semelhantes, são únicas em sua essência, simbologia e significado, ou seja, são insubstituíveis. Dentro do Corpo Literário e Doutrinário de Ifá são mencionadas nos mais diversos Oba Odú e seus Omo Odú. Darei um pequeno resumo sobre a simbologia de cada uma das penas sagradas e em seguida postarei trechos dos Ìtanversos de Ifá.

Ìkódíde trata-se de uma pena de coloração vermelha, extraída da cauda de uma espécie de papagaio africano Psittacus erithacus conhecido popularmente por  papagaio-cinzento, papagaio-do-Gabão ou papagaio-do-congo entre o povo iorubá é denominado de Odíde ou Odíderé. Tornou-se Rei entre todas as aves, simbolo da fecundação, da menstruação, da gestação, representa o nascimento e o simbolo do poder feminino. Representação da realeza, honra e status, esta acima da simbologia do AdéCoroa Real. Fixado a frente da cabeça, representa o processo iniciático e confirma os ritos de iniciação e/ou de passagem. 


Agbè - pena de coloração azul extraída da cauda de uma espécie de ave africana Touraco porphyreolophus, da família dos Musophagidae. Descritos nos mitos, como o pássaro que carregava a boa sorte e a riqueza para OlokunDivindade dos Oceanos. Para que possa agir tem que ser utilizada em contrapartida com o Àlùkò.


Àlùkò - pena de coloração púrpura (entre escarlate e violeta) extraída das asas da espécie de uma ave  africana  Touraco ruspolii da família dos Musophagidae. Descritos nos mitos, como o pássaro que carregava a boa sorte e a riqueza para OlosaA Divindade das Águas Doces. Da mesma família que sua irmã, somente age em companhia do Agbè

Lékeléke - pena de coloração branca, extraída da ave Bubulcus ibis conhecida popularmente por garça-vaqueira ou garça-boieira, nativa da África e do Sul da Europa, que invadiu a América do Norte no início do Século XX e atingiu o Brasil na década de 1960. Descritos nos mitos como o pássaro que carregava a boa sorte e a riqueza para Òrìsà Nla e toda a sua Família Real. Simbolo por excelência de todos os Òrìsà Funfun

Fragmentos dos Textos de Ifá


  1. Agbè ni i gbe're k'Olòkun, 
  2. Aluko ni i gbe're k'Olòsa, 
  3. Odidere-Moba-Odo, 
  4. Omo Agbegbaaje-ka ni  naa ni i gbe're k'Oluwoo.
  5. Gbogbo omi  ni i fori fOlòkun; 
  6. Gbogbo abata ni i fori fOlodò,      
  7. Ire gbogbo lagbara fi sin Olòkun 
  8. Ire gbogbo lagbara fi sin Olodò.
  9. Ire gbogbo


  1. O pássaro Agbè carrega a benção de Olòkun 
  2. O pássaro Àlùkò carrega a benção de Olòsa
  3. O papagaio do Rio Mogba, 
  4. descendência de um poderoso exército carrega uma cabaça com a fortuna para o Rei de Iwó.
  5. As águas doces prestam homenagem à Olòkun                         
  6. As águas do pântano prestam homenagem à Olòsa
  7. A Divindade dos Oceanos com todas as suas bençãos
  8. A Divindade das Águas Doces com todas as suas bençãos
  9. Todas as bençãos



Os pássaros Agbè e Àkùkò são agentes intermediários entre o poder da imensidão das águas. Oluwoo é um título do Rei de Iwó a Legendária Cidade, reduto da ave Odíderé.

  1. Ojúure l'Agbè fi í w'aró.
  2. Agbè won jí t'aró t'aró.
  3. Ojúure l'Àlùkò fi í w'osùn.
  4. Àlùkò won jí t'osùn t'osùn.
  5. Ojúure l'Lékeléke fi í w'efun.
  6. Lékeléke won jí re pel'efun.


  1. O pássaro Agbè desperta com aró.
  2. O pássaro Agbè olha com bondade para aró.
  3. O pássaro Àlùkò desperta com osùn.
  4. O pássaro Àlùkò olha com bondade para osùn.
  5. O pássaro Lékeléke desperta com efun.
  6. O pássaro Lékeléke olha com bondade para efun. 



Cântico da Sociedade Gelede
  1. Agbe ló l’aró, kìí rá’hùn aró.
  2. Àlùkò ló l’osùn, kìí rá’hùn osùn.
  3. Lékèélékèé ló l’efun, kìí rá’hùn efun.


  1. O pássaro Agbè não se lamenta por muito tempo ao aró
  2. O pássaro Àlùkò não se lamenta por muito tempo ao osùn
  3. O pássaro Lékèélékèé não se lamenta por muito tempo ao efun




Neste fragmento dos Textos Sagrados de Ifá relata a ligação das aves Agbè, Àlùkò e Lékeléke com as pinturas sagradas aró (pó de coloração azul, extraída da árvore Indogofera tinctoria), osùn (pó de coloração vermelha, extraída da árvore Pterocarpus osun) e efun (pó de coloração branca, extraído das minas de calcário)

A expressão “despertar” tem a conotação de “ao amanhecer de cada dia” as aves sagradas carregam em si o poder e a essência de três dos quatros Oba Odú primordiais da Existência Universal: Ogbè Méjì relacionado com o efun, Òyèkú Méjì e sua relação com o osùn e ligação de Ìwòri Méjì com o aró


O fato de não se “lamentar por muito tempo, algum tipo de infortúnio” está baseado em uma oferenda denominada de Adimu destinado à Ìyá mi Òsòròngà cujo os principais ingredientes são as referidas penas e pinturas. 


Baba Guido Oni Ajaguna




quinta-feira, 28 de maio de 2015

O PAPAGAIO DO CONGO E A SUA NOBREZA


O PAPAGAIO DO CONGO E A SUA NOBREZA


 Foi Òfún Méjì quem revelou no céu,  
como o papagaio foi transformado
 em um pássaro honorável e como
 ele adquiriu suas penas vermelhas.














papagaio-do-congo (Psittacus erithacus)

Ele assim o fez através do seguinte poema:
  1. Idemu Odide Werewe,
  2. Oni batti anni Aje ile eni dide ninde,
  3. Ayaa ile eni dide ninde,
  4. Omo ile enii dide ninde.
  1. Multiplicado em pequena quantidade.
  2. Ele que obteve múltipla riqueza.
  3. Ele que obteve também múltiplas esposas.
  4. Assim como ele obteve muitos filhos que tem se multiplicado.


Este é o encantamento com o que a divinação foi feita para o papagaio, antes que todas as divindades viessem a descobri-lo, não apenas como um instrumento de decoração, mas também como um símbolo de autoridade e influência. Ele foi avisado a fazer sacrifício com uma peça de pano vermelho, um galo vermelho, pano preto, um pombo, uma galinha e osun (um tipo de pó vermelho). Ele fez o sacrifício na casa de Èşu. Depois disso Èşu convocou o papagaio para uma operação transformadora. Èşu besuntou o pano vermelho com osun e envolveu-o ao redor das penas da cauda do papagaio e prendeu-as com firmeza. No final da operação, todas as penas da cauda do papagaio ficaram vermelhas. Quando Èşu foi questionado sobre o significado da operação, respondeu proclamando que daí em diante, todas as divindades só poderiam ser capazes de ter autoridade e ver o futuro, por meio do uso das penas vermelhas do papagaio. Ele os orientou a comprarem as penas vermelhas do papagaio para se adornarem e enfeitarem. O que explica porque não há divindade que não use as penas do papagaio até hoje, sendo a luz com que eles vêem no futuro. Desde então o papagaio se tornou um pássaro nobre bem como alguém afortunado.

  1. Ojúure lògbólógbòó Odíderé fi í w'Iwó.
  2. Ìkódíde àse kun be aràiyé.
  1. O grande e velho papagaio olha com bondade para Iwó.
  2. O poder da pena do Papagaio enche de súplicas os seres deste mundo.


(Iwó é a Cidade Legendária reduto da ave Odíderé onde essa magnifica ave desempenhava a função de favorecer seu povo com as principais bênçãos e súplicas dos seres humanos).

Baba Guido Oni Ajaguna

O CONCEITO DO BEM E DO MAL


O CONCEITO DO BEM E DO MAL


Aquele que faz o bem, 
faz o bem a si mesmo.
Aquele que faz o mal, 
faz o Mal a si mesmo.
A virtude de se fazer o bem, 

tem sua recompensa benéfica,
e a má, sua consequência maléfica.
Mas se a consciência de alguém é pura e clara,
a “mosca” enviada com a intenção de  se fazer o mal,
não obterá exito em o fazê-lo.


Entendo que o Conceito de Bem e Mal, está inserido na Concepção Filosófica de Moral em nossa religião. Entretanto, referidos conceitos tem seu entendimento equivocado entre os povos-de-santo no Novo Mundo, pois esta noção de Bem e Mal  tem sua fundamentação no sistema Filosófico e Teológico do Cristianismo. Fato este comprova, por estarmos no ocidente, onde tal conceito se encontra fortemente influenciado pelo Catolicismo e o Sincretismo Religioso. Não posso aqui deixar de mencionar que na Afrike Noire não existe O Conceito de Bem e Mal que existe em outras religiões e sim um conceito que auto denomino de Positivo vs. Negativo.

Uma das inúmeras manifestações de energias denominadas de Àse força mítica emanada por ÒlódùmaréO Deus Supremo dos Iorubás, outorgada as Divindades de nosso panteão, tem referencia comparativa com as características de Tolerância vs. Intolerância que possuem todos os Seres Humanos. São virtudes  das quais podem transmutar em ambos os aspectos, seja de forma positiva ou negativa, em uma verdadeira manifestação transmutável. Assim sendo, entendo que em nosso panteão não existe Divindades Boas ou Ruins, pois a bondade e a maldade esta inserida no interior de cada Ser.

Fazemos um retrospecto em nossas vidas e que em algum momento indagamos a nós mesmo: “Deus porque permites que esse Mal cairá sobre mim ?”  Uma das questões mais difíceis para qualquer religioso responder com clareza, seja de nossa ou de qualquer religião existentes nesse mundo. Responder baseando-se no agnosticismo certamente, não é a solução para esse enigmático mistério, pelo menos em minha opinião e particularmente, penso que mesmo havendo muita maldade nesse Mundo de meu Deus, existem muitas coisas boas. Procuro focar apenas o lado Bom do Criador e de suas Divindades, mesmo que nesse “exato momento” Eles permitam que provações e sofrimentos entrem em minha vida. Sempre digo aos meus seguidores que “o sofrimento insere o Homem na vida mística e religiosa”.

Ao analisarmos profundamente A Concepção de Àse a mais poderosa das energias em nossa religião, essa analise nos revela que trata-se de uma “energia pura” e encontra-se em estado de inércia no mundo espiritual – o òrun. Para agir, precisa ser manipulada ritualisticamente, e se considerarmos como energia pura, poderemos transformá-la em energia positiva ou negativa. O que vai transformá-la em força positiva ou negativa, depende unicamente dos “ingredientes” utilizados durante o preparo, e acima de tudo aquilo que se pensa, se fala e se deseja almejar. Essa energia pronta para ser utilizada, poderá ser transferida a objetos, locais, animais ou  pessoas.

Não posso deixar de mencionar que as Àjé (bruxas) e os Osó (feiticeiros) que utilizam do Àse para fins maléficos, no qual dentro da Filosofia de Ifá esta classificado como um dos mais graves tabu, onde o simples pensamento é um feito abominável entre os povos de etnia Iorubá. Sabe-se que aquele individuo que perde seu precioso tempo fazendo trabalhos maléficos em seus mais variados níveis de força, seja por vingança ou simplesmente com intuito financeiro, esta se privando do desenvolvimento espiritual e consequentemente causando  sua própria desarmonia espiritual, em outras palavras, quanto mais se volta ao lado negro da força, mais se afasta da luz da verdade. Uma vez detentor dessa poderosa energia, terá o Livre Arbítrio de usá-la da maneira que lhe for mais conveniente, seja para fazer o bem ou o mal ao seu semelhante.


Aquele que por sua vez encontra-se em harmonia com o mundo espiritual e material, sobretudo com seu Orí, - Divindade que reside na Cabeça Interior, dificilmente será atingido pelas forças maléficas; não que esse individuo seja imune aos mais diversos Caminhos do Mal, mas aquele inimigo, seja oculto ou declarado que pretende-lhe prejudicar, terá que desdobrar seus esforços para obter exito em sua investida. Ademas, sempre digo que a verdadeira feitiçaria tem que ser sob encomenda e sob medida, porque sempre digo: “O feitiço que derruba Chico não derruba Francisco”. De forma mais clara e objetiva antes das Àjé ou Osó atacarem, ambos se preparam, necessitam saber o “caminho” em que suas “vitimas” se encontram e encontram-se mais vulneráveis, para assim poderem atacá-las. Da mesma maneira ocorrerá com os espíritos ou energias maléficas,  que ao encontrarem um individuo em plena harmonia com sua  espiritualidade, terá que enfrentar seus Guardiões e Protetores Divinos

Lembrando que aquele que se sinta influenciado por energias maléficas nos quatro níveis de compreensão, ou seja, na Percepção, na Aproximação, no Contato e no Envolvimento, deve de imediato  consultar o oráculo, afim de obter o “antidoto”, se assim for necessário, para sanar o “veneno” da feitiçaria, e em conjunto com a harmonia espiritual, obterá  força física, mental e espiritual para vencer a essa força nefasta. O sofrimento, seja  cometido pela feitiçaria, por espíritos ou energias maléficas, quando enfrentado com coragem e resignação, torna-se fator importante do aperfeiçoamento espiritual. Recordemos que não basta apenas a coragem para enfrentar os obstáculos da vida necessitamos também do estímulo místico, ou seja, da religião.

Nem todo os aspectos do mal são proveniente de feitiços ou espíritos  ruins. Um individuo perturbado em seus pensamentos negativos, poderá facilmente atrair energias negativas, assim como qualquer pessoa pode convidar o mal ou energias negativas, adentrar sua casa. Essas energias se alojam nos batentes das portas de entrada da casa, a espera de um chamado ou de uma oportunidade para invadir o local. Esse é o motivo que em muitos dos ebooferendas e sacrifícios destinados a “limpar a casa”, passamos determinados ingredientes no batente da porta principal para depois serem despachados; assim como esse é um dos motivos que os recém iniciados rodopiam ao passar pelas portas.

Para uma melhor compreensão sobre a Concepção de Bem e Mal dentro do Conceito Filosófico  e Religioso, é necessário e obrigatória, se assim posso me expressar, possuir uma sabedoria implícita e  profunda sobre uma das mais importantes e indispensáveis virtudes dos códigos encerrados no Corpo  Literário e Doutrinário de Ifá, o Código do Bom Caráter denominado entre os Iorubás de Ìwà Pèlé, que sobrepassa qualquer visão filosófica nesse mundo, e ainda afirmo trans ponhe qualquer outra visão filosófica no planeta, porque essa visão Filosófica de Ifá é absolutamente única. Aquele que possui conhecimento, entendimento e sabedoria sobre o Ìwà Pèlé tem em seu Eu Interior a consciência dos efeitos que causam o ato de maldade e perversidade para com seus semelhantes, e aquilo que não precisamos neste texto é citar os efeitos Ação vs. Reação,  a tradicional Lei do Retorno e a Superioridade do Bem contra o Mal.


O Ìwà Pèlé merece um post ou um estudo a parte, pois falarmos de Irebondade, seria um tema de alegria e beneficio, porque se sabe que os Ire mantem o Ìwà em toda sua plenitude e nos conduz ao caminho em busca de uma sólida espiritualidade.

Baba Guido Oni Ajaguna

ADÚRÀ – O Sentido da Oração



ADÚRÀ – O Sentido da Oração



No mundo todo, em qualquer cultura ou religião, as pessoas oram... 


Elas oram sozinhas ou em grupos; oram em igrejas, em templos, sinagogas, mesquitas e santuários. Talvez usem tapetes de oração, rosários, rodas de oração, livros, imagens e tabuinhas penduradas em prateleiras.

Dentro de nossa religião a palavra oração, reza, prece ou suplica é conhecida entre o "povo-de-santo" por adúrà ou gbàdúrà Òrìsà que significa “rezar ou oferecer uma prece as divindades”. A oração geralmente é vista como um meio do iniciado entrar em contato com o domínio espiritual, algo que deva ser entendido como sagrado e eterno. O ato de rezar faz parte da “necessidade espiritual” de qualquer religioso e a maior parte de nossos rituais litúrgicos são seguidos de  adúrà ou mesmo antecedem determinados ritos. A oração e o rito se fundem mas não se confundem e um complementa o outro.

São inúmeras as orações destinada as Divindades do Panteão Iorubá e uma única divindade chega ter mais de um adúrà. Por mais variadas que sejam, essas orações tem algo em comum, estabelecer uma comunicação com um plano em outra dimensão denominado de òrun o mundo sobrenatural. Os antigos que ainda tem o hábito de orar a seus Òrìsà, sabem qual é o fator principal para que suas suplicas sejam ouvidas e a quem dirigir suas orações, algo muitas vezes desconsiderado no mundo de hoje, principalmente pelos novatos. Na atualidade vemos diversos iniciados e consagrados, revelarem com um certo constrangimento ao dizer que não sabem rezar para sua própria Divindade Tutelar ou mesmo nunca terem participado ou sequer ouvido falar da Cerimônia do Nle um conjunto enorme de orações são entoadas antes do amanhecer. Embora a referida cerimônia somente seja realizada quando das Festividades Anuais, existem outras adúrà que complementam diversos  ritos.

Muitos tradicionalistas enfatizam os aspectos físicos da oração, como postura dojúbolè ou dùbúlèdeitado ou curvado e rituais ìpatéwo ou pawobater palmas e o aspecto mental, ou seja, principalmente orar de coração - tokàntokàn, expressando nesse momento seu profundo sentimento. Para orarmos em harmonia com a vontade das divindades, precisamos saber qual a vontade delas. Assim entender o verdadeiro significado da reza, é um fator importante no que diz respeito a oração.

Alguns Babalòrìsà e ÌyálòrìsàSacerdotes e Sacerdotisas, orientam seus seguidores que os adúrà  somente devem ser proferidos, dentro dos Limites do Terreiro; contrário a outros que ensinam a seus discípulos, orações restritas ao “quarto-de- santo”  e as que possam ser dirigidas as divindades no cotidiano do dia-a-dia, principalmente ao amanhecer. A falta de conhecimento dessas orações especificas para ocasiões especiais, muitos consideram a oração cristã mais repetida no mundo. Quer isso seja verdade, quer não, a oração modelo de Jesus, às vezes chamada de Pai-Nosso, com certeza é uma das orações que muitos iniciados nos mistérios dos Òrìsà, repetem suas palavras mecanicamente todo dia, talvez várias vezes no dia.

No atual mundo descrente, muitos duvidam que os adúrà tenham algum valor prático; alegam que repetir palavras sem o devido conhecimento  e entendimento do que estão proferindo, não tem nenhuma validade. Desconhecer o conteúdo oculto de uma oração não justifica o desdem para com ela. Orar nos beneficia de alguma forma e nessa hora o exercício dos mais-velhos é de suma importância. Somente alguém mais sábio e que viveu a mais tempo na religião auxilia os mais-novos e os movem a rezar. Na verdade, a prece pode nos ajudar muito no sentido espiritual, seja individual ou em prol da comunidade-terreiro.

Baba Guido Oni Ajaguna

AMULETOS & TALISMÃS IORUBÁS



AMULETOS & TALISMÃS IORUBÁS
 

A proteção talismânica


Talismãs denominado no Idioma Iorubá de óndè, e em outras linhagens ìra, são objetos mágicos que podem ser usados com a finalidade de proteção na vida diária de um individuo. Pode ser usado com a intenção de opulência e poder, atrair a boa sorte, na vida financeira, assuntos amorosos, familiares e o mais importante de todos, para ter boa saúde. Alguns são de uso permanente, individual e intransferível, enquanto outros são de uso temporários. Suas funções se  sobrepunham em uma extensão considerável, mas a principal função do talismã é atrair influências psíquicas favoráveis, diferente do amuleto que dá um escudo defensivo contra adversidades de todos os tipos, incluindo o ataque de “espíritos malignos” denominados de AjogunOs Inimigos dos Homens. Cada um deles representa, portanto, um aspecto distinto da força mítica – o talismã, atrai o positivo, enquanto o amuleto, afasta o negativo.

O Patuá, nome popular dado ao talismã, deve ser confeccionado “sob encomenda”, ou seja, ter em seu interior um aglomerado de substâncias,  afim de agir sobre aquilo que lhe esta destinado a cumprir. Ele deve ser preparado em fase lunar correta, em lugar limpo, isto é, que seja psiquicamente estéril, ou, em outras palavras, absolutamente livre de todas as emanações malignas. Por esse meio o talismã é imbuído de qualidades magnéticas poderosas que atrairão a boa sorte em uma escala sempre em ampliação.

O talismã é um objecto consagrado que traz em si o àse, a força mágica das divindades a quem ele é consagrado. Confeccionados em couro dos mais diversos animais ou em tecidos resistentes ao tempo, em seu interior guarda-se os mais diversos ingredientes, tais como: raízes, folhas, sementes, flores, cascas, favas, ossos, pêlos de diversos animais, penas, sangue seco, terra, areia e minérios. Cada qual com seus ingredientes necessários, cada qual com suas cores e adornos correspondente ao propósito do óndè. Esses objetos mágicos e repleto de miticismo, tem sido empregados desde os tempos mais remotos, nas mais diversas crenças e culturas, em relação a qualquer situação ou atividade que se possa conceber.
  
Mas aonde estão os patuás afro-brasileiros?

Sem medo de equivocar-me, afirmo que estão em poder de poucos iniciados nesse mistério. Alguns religiosos afirmam que estes são dispensáveis, já que acreditam que apenas os ebo e o adimu oferendas, seja suficiente para solucionar os mais diversos problemas do consulente. Entretanto muitos trabalhos exigem a confecção do óndè, pois acredita-se que a oferenda solucione o problema em questão, mas que o patuá irá manter por um longo tempo esta energia positiva. Esse Saber Tradicional a cada dia vem se perdendo, esta sendo descolorado pela distância que existe no fechamento da informação. Quando menciono “Os mais velhos morrem e não divulgam tudo o que sabem, fizeram de travesseiro o seu saber”, isso é algo que deve ser analisado de dois pontos de vista. O primeiro é o awoo segredo, arma de guarda e defesa, e o segundo, um rigor seletivo na busca de discípulos dignos dos preceitos e fundamentos ritualísticos. Em nossa religião o saber sempre se realiza no real; "quem sabe, não sabe para si nem por si, sabe a partir da necessidade e para os fins". O conhecimento, o entendimento e a sabedoria, são três em um, este conjunto é ao mesmo tempo o segredo, a necessidade e a capacidade de materializar o conhecimento, transmutando mitos em ritos. Quanto mais conhecimento se adquire nesta jornada religiosa, tanto mais será a necessidade de ritos e práticas.

Outro fator a ser observado é a hostilidade da igreja, quando os primeiros eclesiásticos algumas vezes consideravam difícil distinguir entre invocações mágicas que eram proibidas e preces legítimas usadas em conjunção com talismãs e amuletos, e a Inquisição considerou criar um sistema de regras para remediar a situação. Um talismã ou amuleto era proibido se ele incorporasse qualquer intenção ou sugestão de pacto com Deuses e/ou Divindades de nomes desconhecidos, declarações não verdadeiras aos olhos do cristianismo, qualquer outro símbolo que não o Sinal da Cruz, quaisquer frases que não fossem da Bíblia. Finalmente, sua preparação tinha que ser desacompanhada de ritos supersticiosos e tinha que depender inteiramente da generosidade de Deus para sua efetividade. Logo o clero percebeu que não poderia impedir o uso dos patuás pelos negros, que os tiravam antes de entrar nas igrejas, mas voltavam a usá-los ao afastar-se dela. Decidiram, então, substituir os patuás africanos, que traziam seus “ingredientes mágicos”, por outro que trazia orações católicas, medalhas sagradas, agnus dei, etc.

Podemos encontrar os mais variados patuás a venda em lojas de artigos religiosos espalhadas por todo o território nacional, na famosa Feira de São Joaquim ou ainda no Mercado Modelo de Salvador – BA ou mesmo no Mercado da Madureira – RJ. Mas com todo respeito os consideram apenas como um produto comercial, pois fogem do verdadeiro conceito mágico-religioso. 

Isso me leva a lembrar de Eduardo Fonseca Júnior, que em sua obra, cito o DICIONÁRIO YORUBÁ (NAGÔ) – PORTUGUÊS, averba a seguinte palavra: óndè – subs. Enfeite costurado no couro e usado pelas pessoas como adorno. Se Fonseca está se referindo aos patuás produzidos em escala industrial, está mais do que correto; mas se tratando do óndè de origem Iorubá, está completamente equivocado. O valor que se paga nesses falsos patuás é ínfimo em comparação aos verdadeiro, é tão irrisório que vale a pena comprar um e abri-lo para se constatar o que há dentro deles “um recorte de jornal”.   
  
Os tipos de talismã


Os  óndè ìdáàbòbò conhecido no dito popular de “patuás de proteção”, podem carregar uma ou múltiplas funções de acordo com a necessidade de cada individuo. Entre eles temos:

lówó èpè, contra maldições; 
lówó ibi, contra o mal; 
lówó ìjà, contra brigas,  
lówó  ìjàmbá, sobreviver sem ferimentos a um acidente de carro; lówó òjijì, contra a morte súbita; 
lówó iro pipa momi, contra falsas acusações; 
lówó ojúkòkòrò, contra ganância;
lówó olè, contra ladrões; 
lówó ogbé, contra ferimentos de faca; 
lówó ò, contra inimigos; 
lówó àbìlù, contra trabalhos maléficos; 
lówó ejó, contra processos judiciais e 
lówó àgbéró àìlù, contra agressões de todos os tipos. 

Os óndè citadossão de uso individual e intransferível, pois durante seu preparo será adicionado um pertence do solicitante, deverá ser usado constantemente e conservado pela pessoa se assim desejar que este seja efetivo.

óndè oríire, tem a finalidade de atrair a boa sorte, podem ser de uso pessoal, ou ainda, pendurados atrás da porta de entrada de residências e comércios. Seus ingredientes variam de acordo com a energia que “trás a sorte” para dentro da casa ou do comércio. Sem duvida neste ultimo, na maioria da vezes tem como complemento o àse de Èsù.

óndè àwúre owó níní, por sua vez, são destinado para ganhar dinheiro; jekajè– de  forma rápida e ìtajàpara ter sucesso rápido nas vendas. Estes são usados em contato com o corpo, apenas durante a jornada de trabalho; além de ajudar nas vendas tem a função de proteger contra o “mau olhado” de outros colegas de trabalho, que podem inconscientemente invejar seu progresso. Seu conteúdo depende da divindade que proporciona  “caminho financeiro” ao consulente.

óndè òràn para processos judiciais, que deverá ser utilizado pelo solicitante doze dias antes do julgamento do processo e despachado somente após ser dado o veredito. Este tipo de patuá é um complemento dos trabalhos realizados nos caminhos de Sàngó e a esta divindade somente se pede aquilo que lhe é de direito, não serve para indivíduos que vivem a margem da sociedade; estes tem que “contar com a sorte” dos afòràn – trabalhos para escapar de processos na justiça.

óndè àwúre ìféràn para obter exito na vida amorosa, conseguir um relacionamento firme e duradouro. Existem várias pessoas que tem dificuldade de encontrar a sua “outra metade” e muitos consulentes procuram nossa religião com o intuito de sanar este tipo de problema que em muitos casos, causam transtornos. De imediato não se sabe a que momento este deverá ser despachado; pode ser antes ou depois do casamento. Dentro deste deverá conter o àse da divindade que dá “caminho sentimental” do consulente e nunca deverá conter o nome de um casal, aqui não se trata de “trabalhos de amarração”

óndè ìbímo são amplamente utilizados nos trabalhos para facilitar a concepção – ìmú obìrin l'óyún, de mulheres com problemas para engravidar; em muitos casos são usados para assegurar a gravidez ou evitar o aborto espontâneo – ìmú óyún dúró, do qual este deverá ser amarrado na cintura da gestante e para que o parto seja fácil – àwèbí. Este tipo de patuá é utilizado como um complemento dos complexos trabalhos ligados à Ìyámi Òsòròngà – Òsun – Yemojá – Òrìsà-nlá as divindades da fertilidade e que são propícios a darem  filhos aos seres humanos. Depois de alcançar o que se desejou, enterra-se em um pé de árvore frutífera, cujo o tronco não se consiga abraçar. Dentro deste grupo, temos o  óndè agbo omo – que servem de proteção para a saúde da criança. Este tipo de patuá não se despacha, até que a criança atinja a adolescência e durante este período a mesma não pode estar ciente do que se trata tal objeto.

óndè ìségun òtá – para ter vitória sobre os inimigos ocultos e declarados. São confeccionados para pessoas vitimas de perseguições e seus elementos estão ligados as divindades que carregam espadas.

óndè ìlera – para ter boa saúde, um do mais preciosos talismã, pois com saúde, teremos força para a labuta e os “caminhos da vida”. Destinado as pessoas com a saúde frágil ou debilitada e quando acamadas, pendura-se na cabeceira da cama um óndè fun aláàrè que tem como objetivo afastar o mal de um doente. Várias divindades dão “caminhos a boa saúde”, por mais incrível que possa parecer até mesmo Nã Buku.

Temos ainda o mais elaborado de todos: o  óndè  àìkú – para evitar a morte prematura; entretanto quando menciono “morte prematura” estou me referindo aquele esta desviado de seu verdadeiro destino, pois “quando Ikú chegar, não haverá médico para lhe curar nem advogado para lhe defender”. Um patuá muito conhecido entre o povo-de-santo para esta finalidade é o colar confeccionado em trança de palha-da-costa, no comprimento acima do umbigo e com um ìkódíde em cada extremidade. Após verificar no oráculo que o consulente não se encontra mais no “caminho da morte”, este patuá deverá ser despacho cerimonialmente por aquele que o preparou.

Na verdade, a procura do patuá ou talismã é feita principalmente por quem se sente inseguro e conseqüentemente necessitado de maior proteção. Por sua vez, o talismã não tem somente o poder de preservar o bem-estar físico e mental de quem o usa, mas ajuda a reforçar as energias psíquicas dos onísègunmédicos da Medicina Tradicional Iorubá. 
  
Os amuletos e suas propriedades
  
O amuleto tem um papel grandemente defensivo, sendo algumas vezes prescrito como um “feitiço passivo”, uma vez que é designado principalmente para proteger quem o usa contra a desgraças ou malefícios. Dentro da Cultura Ioruba ele se apresenta de várias formas: em fios de contas, pedras, corais, búzios, palha-da-costa, pulseiras de marfim, ossos de animais e nos mais variáveis metais. Os elementos do amuleto têm que corresponder com a Divindade Tutelar que protege aquele que se submete a usar está proteção mágico-religiosa, receber o àse do reino animal, vegetal e mineral. Muitas vezes entre os citados, poderemos incluir os amuletos confeccionados com pontas de chifres dos mais diversos animais, dos quais carregam em seu interior um segredo. Os fios de contas denominados em Iorubá de ìleke, merecem um estudo a parte, principalmente em relação a “cerimonia de lavagem das contas”.

Baba Guido Oni Ajaguna



OS LIMIARES DA DEPRESSÃO



OS LIMIARES DA DEPRESSÃO 



Transitamos por um momento muito grave
 na historiografia das nossas existências psicológicas,
 vivemos a Hora da Depressão. 


Sem qualquer duvida a depressão na atualidade é de caráter pandêmico. A Organização Mundial de Saúde (OMS), revela que a depressão atinge 121 milhões de pessoas ao redor do mundo e está entre as principais causas de incapacidade total ou parcial de um indivíduo. Considerada a segunda maior causa de deficiência na historiografia de nossas vidas, a OMS prevê que até o ano de 2020 a depressão passe a ser a segunda maior causa de incapacidade e perda de qualidade de vida, depois apenas das doenças cardiovasculares, e a expectativa é que nos próximos 10 anos se torne a primeira, alcançando a margens dos 400 milhões e isso é um número assustador.  

Depressão é geralmente diagnosticada quando o paciente exibe um ou ambos dos dois sintomas principais: Humor depressivo e falta de interesse nas atividades do dia a dia, junto com quatro ou mais sintomas como sentimentos de inutilidade ou culpa inapropriada, diminuição da habilidade de se concentrar ou tomar decisões, fadiga além do normal ou do razoável em face da própria rotina e agitação psicomotora (caracterizada quando a pessoa não consegue se aquietar), insônia ou excesso de sono. Podendo haver também queda ou aumento significativo de peso ou apetite, além de, nos casos mais extremos, pensamentos recorrentes de morte ou suicídio. A doença está associada à morte por suicídio de cerca de 850.000 pessoas por ano, conforme dados da Organização Mundial de Saúde (OMS).
O problema é que, além das causas tipicamente biológicas, pensamentos distorcidos contribuem para o desencadeamento da depressão derivada em grande parte dessas distorções cognitivas. O individuo depressivo não se avalia rigorosamente, não tem auto-estima, tende a pensar simplesmente que não é tão bom ou melhor que os outros, e constantemente deprecia seu valor e sua capacidade de interagir nesse mundo. Pessoas depressivas são reduzidas a "corpos quebrados e cérebros despedaçados" que necessitam ser restaurados. Ainda que o aspecto biológico da depressão seja mais complexo que um simples desequilíbrio químico, a enfermidade é associada, não obstante, como regulação insignificante dos mensageiros químicos do cérebro, como a serotonina. Se não tratada devidamente, pode levar a uma incapacidade de gerenciar a própria vida e à perda da responsabilidade em relação aos outros.
De suma importância mencionar que, equivoca-se aquele que pense que a depressão seja a "doença da modernidade". Essa enfermidade é muito mais antiga do que muitos sequer possam imaginar. Há registros de casos de depressão que remontam à antiguidade.
De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria, a depressão tem natureza recorrente, como uma enxaqueca. Porém, 70% dos depressivos respondem bem ao tratamento. Os outros 30% têm resposta parcial ou não apresentam qualquer sinal de melhora. De acordo com a OMS, pouco mais de 25% das pessoas afetadas pela doença no mundo recebem o tratamento adequado. No Brasil, esse índice só não é maior devido à falta de preparo de uma parcela de profissionais de saúde em reconhecer os sintomas da doença e encaminhar os pacientes para o tratamento adequado.  A doença está associada à morte por suicídio de cerca de 850.000 pessoas por ano, conforme dados da Organização Mundial de Saúde (OMS).
 Não deve ser surpresa, então, que os depressivos estejam não somente nos hospitais e clínicas, mas nos "templos religiosos" das mais diversas religiões. A Depressão em seus mais diversos níveis psicopatológicos, é frequentemente um mal além de qualquer descrição, que atinge homens, mulheres e mesmo crianças, e quando tais profundos e dolorosos sentimentos não podem ser explanados, eles cortam o coração de um "Ser Espiritual". Se as religiões querem efetivamente ministrar pessoas nessas condições, elas devem contar com toda a complexidade do ser humano, e acima de tudo tratar com seriedade. Utilizando de uma linguagem psicológica para questões espirituais, devemos nos conscientizar, que existem linhas divisórias, não muito claras e as vezes totalmente obscuras, entre o que é fisiológico, o que é psicológico e o que é espiritual. Fato importante para os religiosos admitirem tal complexidade, e que influenciara em  nossa conduta, comportamento e nosso grau de responsabilidade, para com a pessoa depressiva. Na tentativa de simplificarmos os fatos, não ajudaremos absolutamente em nada essas pessoas.
Baba Guido Oni Ajaguna

A Língua e o Poder da Fala – Reflexões



A Língua e o Poder da Fala – Reflexões



"O Mestre disse: 
Homem! presta atenção quando abres a boca.
O Discípulo retrucou: 
Desculpe, foi a minha língua fogosa que me traiu!"



A língua é o mensageiro do cérebro e ambos são as duas peças fundamentais na organização social e na subsistência do Homem moderno. Baseando-se no refrão inserido no Odu Ogbè-Ìretè "A língua perdeu a cabeça”, se faz presente a orientação em relação a pessoas que não pensam, nem analisam antes de falar, levando a se expressar de forma incoerente, tais como: revelando assuntos, dos quais não são de sua alçada; comentários destrutivos sobre pessoas que nem ao mesmo conhece, sem fundamentos, na maioria das vezes repetindo o que os demais dizem; deturpam acontecimentos aproveitando de sua posição sócio religiosa, incentivando os demais a participarem do assunto, mesmo preferindo ficarem em silêncio absoluto. Na maioria das vezes o “protagonista” não esta presente e como sabemos, toda ausência é um atrevimento”, ou como se diz o adágio:

“Não se pode pentear uma pessoa, quando a mesma encontra-se ausente"

Esta são apenas algumas das atitudes de pessoas, que em sua maioria são inteligentes, intelectuais e mesmo assim fazem o mal uso da língua. Em termos gerais, não sendo via de regras, tudo isto pode estar sendo do resultado da ignorância de muitas pessoas.

“A única defesa de um ignorante é a língua"

A Tradição Africana, portanto, concebe a fala como um dom divino. Ela é ao mesmo tempo divina no sentido descendente e sagrada no sentido ascendente. A Tradição Africana, como se ensina, depositou no ser humano as três potencialidades: do poder, do querer e só saber, contidas nos elementos dos quais o ser humano foi composto. Mas todas essas forças, das quais o Homem é herdeiro, permanecem silenciadas dentro dele. Ficam em estado de repouso até o instante em que a fala venha colocá-las em movimento. Vivificadas pela palavra divina, essas forças começam a vibrar. Numa primeira fase, tornam-se pensamentos; numa segunda, som e numa terceira, a fala propriamente dita. A fala é portanto, considerada como a materialização, ou a exteriorização das vibrações das forças das quais podem ser positivas ou negativas.

Do mesmo modo sendo a exteriorização das vibrações das forças, toda manifestação de uma só força, seja qual for a forma que assuma, deve ser considerada como a sua fala. É por isso que no Universo religioso a fala é sagrada e ao mesmo tempo profana, tudo é fala que ganhou corpo e forma: “Falar é dar força e por extensão, materializar”. Se a fala é força, é porque ela cria uma ligação de vaivém que gera movimento e ritmo, e, portanto, vida e ação – "Como um Homem que se levanta e se volta ao ouvir seu nome".

A fala pode criar a paz, assim como pode destruí-la. É como o fogo. Uma única palavra imprudente pode desencadear uma guerra, do mesmo modo que um graveto em chamas pode provocar um grande incêndio. A Tradição, pois, confere a palavra, não só um poder criador, mas também a dupla função de conservar e destruir. Por essa razão a fala, por excelência, é o grande ativo da “magia africana” e a fala deve ser usada com cautela.

“A fala ´divinamente exata, convém ser exato para com ela”

Por esse motivo a maior parte das sociedades orais tradicionais, considera a mentira e a calunia uma verdadeira “lepra moral”. Na Africa Tradicional, aquele que falta ou viola à palavra mata sua pessoa civil, religiosa e oculta. Ele se separa de si mesmo e da sociedade. Seria preferível que morresse, tanto para si próprio como para os seus entes queridos.

“A língua que falsifica a palavra, vicia o sangue daquele que mente”

O sangue simboliza aqui a força vital interior, cuja harmonia é perturbada pela mentira. Dizem os adágios: “Aquele que corrompe sua palavra, corrompe a si próprio” ou "Quando alguém pensa uma coisa e diz outra, separa-se de si mesmo", ou seja,  rompe a unidade sagrada, reflexo da unidade cósmica, criando desarmonia e desequilíbrio dentro e ao redor de si.

“Se a fala constrói a cidade, o silêncio edifica o mundo”

diz um provérbio africano. 
Talvez por isso diga um outro:

  “O que o silêncio não pode melhorar, a fala também não o fará"

São sudanesas estas máximas, mas representam toda uma atitude generalizada na África e uma diáspora quanto a comunicação do indivíduo com o interior. Há uma valorização ética do silêncio como espaço do esclarecimento e da seriedade, enquanto à fala se atribui o perigo da levidade e da confusão. Apenas o “perigo”, fique bem claro. O Homem que vive a Tradição Oral, não é mudo, nem silencioso, deve ser entendido como mera ausência de “verbo”. Pelo contrário, silêncio é a realidade que engendra o ato verbal, que dá à luz da palavra, por ser a força que conduz o indivíduo à sua própria interioridade e eclosão de uma verdade. Silêncio é coisa de “dentro”, palavra é coisa de “fora” - no jogo ponderado dos dois espaços, se faz a comunicação equilibrada com o mundo material e o mundo espiritual.



Baba Guido Oni Ajaguna

ODÙ ÌROSÙN ÒSÁ Esè Ifá – Ode ati Apáòka



ODÙ ÌROSÙN ÒSÁ

Esè Ifá – Ode ati Apáòka



1. Ìtàn Àtowódowo, Ìtàn Àtowódowo

2. Ìtàn Àtowódowo, Ìtàn Àtowódowo
3. O oráculo foi consultado para Ode
4. No dia em que ele estava indo caçar
5. Òrúnmìlà disse para Ode
6. Que ele deveria realizar oferendas propicias
7. Para que ele não se perdesse na floresta
8.Ode não ouviu, ele não realizou as oferendas
9. Ele disse que conhecia a floresta muito bem
10. E nunca se perderia dentro dela
11.Ode foi a floresta
12. Ele estava procurando uma caça
13. Ele viu um rastro no chão
14. Ele começou a segui-lo
15. Quando Ode parou para olhar o rastro
16. Ele colocou seu o no chão
17. Ele olhou o rastro novamente
18. Ode levantou-se
19. Ele iria continuar a seguir o rastro
20. Quando Ode foi pegar seu  o
21. Ele não o encontrou mais
22. Ele começou a procurar
23. Ele procurou na frente
24. Ele procurou atrás
25. Ele procurou a direita
26. Ele procurou a esquerda
27. Ele procurou em cima
28. Ele procurou embaixo
29. Ode não encontrou seu  o
30. Ele estava cansado
31. Ele estava com fome
32. Ele não tinha mais arma para caçar
33. Ele continuou andando sem rumo
34. Ele não sabia mais onde estava
35.Ode viu uma árvore
36. Igi Apáòka foi a árvore que ele viu
37. Ele estava exausto
38. Ewé jagba eram as folhas que estavam forrando o chão
39. Ode deitou-se em cima destas folhas
40. Ele adormeceu
41. Então o que?
42. Um Ilé Oyin é o que estava no Apáòka
43. Oyin começou a pingar sobre a boca de Ode
44. Quando ele acordou
45. Sua boca estava doce
46. Seu corpo estava todo coberto de mel
47. Ode estava com fome
48. Ele aparou o mel com as mãos
49. E começou a comê-lo
50. Enquanto estava comendo
51. Uma fruta do Apáòka
52. Caiu ao seu lado
53. Quando ela caiu, ela se abriu
54. Quando ela se abriu
55. Um cheiro delicioso começou a exalar
56. Ode começou a comê-la
57. As abelhas também sentiram o cheiro
58. Elas começaram a rodear Ode
59. Elas também desejavam o doce da fruta
60. Elas começaram a juntar
61. Elas ajuntaram, ajuntaram
62. Ode as espantavam com o irùkèrè
63. Ele não pode mais comê-la
64. Ele viu que era da árvore dessa fruta
65. Que as abelhas faziam o mel
66. Ode compreendeu
67. Ele ficou ali quatro dias
68. Mel foi o alimento de Ode naqueles dias
69. Ewé jagba foi a folha que ele dormiu em cima
70. Ode recuperou-se
71. Ele estava bom
72. Ele já sabia como voltar
73. Ele apanhou dezesseis  ewé jagba
74. Ele começou a fazer o caminho de volta
75. Quando ele chegou no lugar onde tinha visto o rastro
76. Ele encontrou seu o
77. Ele o guardou junto com as dezesseis ewé jagba
78. Ode voltou
79. Ele foi ver Òrúnmìlà
80. Ele foi fazer a oferenda
81. Que ele tinha recusado fazer
82. Ele disse: “A partir de agora”
83. Ele disse: “Nenhum caçador deverá entrar na floresta”
84. Ele disse: “Sem antes realizar a oferenda prescrita por Ifá
85. Ele disse: “Todos os seus descendentes”
86. Ele disse: “Não se alimentariam mais de mel”
87. Ele disse: “Somente se alguém não tiver nada para comer”
88. Ele disse: “E em casos de extrema necessidade”
89. Ele disse: “Somente nesses casos”
90. Ele disse: “Alguém poderia comer mel”
91. Ele disse: “Todos os seus descendentes”
92. Ele disse: “Nunca mais matariam nenhuma abelha”
93. Ele disse: “ Ewé jagba seria sua principal folha”
94. Ele disse: “E sempre deverá estar presente em seus rituais”
95. Ele disse: “Todos os seus descendentes”
96. Ele disse: “Nunca mais deveriam comer a fruta do Apáòka
97.Ode estava alegre, ele estava contente
98. Ele estava cantando, ele estava dançando


Ode Aro bí ewé,
Aro bí ewé jagba,
Olówo bí ewé,
Ode Aro bí ewé jagba,
Olówó bí ewé.

O Caçador da família Aro nasce da folha
Membro da família Aro nasce da folha jagba
O Rico nasce da folha
Membro da família Aro nasce da folha jagba
O Afortunado nasce da folha

99. É assim que Ifá nos fala

100. Porque Ode não come mel de abelha
101. Porque Ode não come o fruto do Apáòka
102. E como Apáòka veio a ser o principal fundamento de Ode
103. E como o ewé jagba veio a fazer parte de seu Àse
104. E porque Ode e seus descendentes não matam as abelhas
105. Ifá diz assim
106. Ìrosùn-Òsá nos revela isso.

Baba Guido Oni Ajaguna