terça-feira, 15 de novembro de 2016

TERREIRO DE CANDOMBLÉ EM SOLO PRÓPRIO NÃO DESMERECE AQUELE QUE ESTA EM SOLO ALHEIO!


TERREIRO DE CANDOMBLÉ EM SOLO PRÓPRIO NÃO DEMERECE AQUELE QUE ESTA EM SOLO ALHEIO!

De certo que exista uma linha que separe um Terreiro estabelecido em casa própria daquele que se estabelece temporariamente em casa alugada.

Sabemos que em terras próprias podemos “acomodar” determinadas Divindades, Deidades e Entidades, que não se poderiam fazer presentes em terras alheias. Mas isso não implica no impedimento de realizar ritos de iniciação e consagração, pois se assim o fosse, muitos iniciados deveriam fazer a sua re-iniciação no Culto aos Òrìà.

Poderia aqui nessa postagem, citar nomes de Grandes Baba e Ìyálòrìà que começaram o seu Legado Religioso em casas de aluguel e se mudaram por várias vezes para outras casas ainda que alugadas, até seu Terreiro se estabelecer definitivamente em sua propriedade.

Mas não vejo essa necessidade de dar “nome aos bois”, pois muito dos meus leitores tem a mesma “idade de santo” que a minha pessoa e muitos aqui ainda são “meus mais velhos” e devem recordar perfeitamente daqueles que começaram a sua “Jornada Religiosa em Terra Alheia”.

Entretanto, é inadmissível ouvir de um Baba ou Ìyá, assim como de seus descendentes, que num passado principiou suas atividades em solo alheio dizer: “Quem não tem casa própria, não pode ser Pai ou Mãe de Santo, não pode abrir Casa de Santo”. Aquele ou aquela que assim diz, esta se referindo a si próprio de que maneira? Para que tamanha hipocrisia? Qual a finalidade de querer esconder esse passado?

Em uma colocação mui particular, acredito que a frase mais adequada seria a seguinte: “No passado eu tinha Terreiro de Candomblé em casa de aluguel, mas lhe aconselho abrir a sua Casa de Santo em terreno próprio pelos seguintes motivos...”.

Mas infelizmente em nossas vidas “Temos histórias para contar e histórias para esconder”, até mesmo em nossa vida religiosa.


Baba Guido Olo Ajaguna

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

BABA GUIDO CANTAVA MUITO, AGORA CANTA POUCO!!!




Num passado não tão longínquo, eu cantava 1.000 cantigas para os Orixás, agora canto apenas 100. Mas desses 100 cânticos eu sei a interpretação, o significado, ou seja, a essência da cantiga e o momento mais apropriado para ser entoada.

Não canto mais absolutamente nada daquilo que não sei ou não tenho a mínima noção do que esteja pronunciando, independente da fonte de origem da cantiga. O dito popular entre o Povo de Santo: “Eu canto assim porque Pai ou Mãe Fulana cantava assim” comigo não funciona; embora respeite quem compartilhe desse pensamento.

Sou convicto e assumido que um dia habitei a “Terra dos Papagaios”, mas optei em não mais viver nessa “civilização de pessoas que memoriza e repete o que ouve ou lê, sem compreender o que diz.”, embora respeite quem ainda permaneça nela, com seu imenso repertório de toadas, muito delas condenadas à “Eterna Escuridão do Entendimento”.

Minha eterna gratidão aos “meus mestres” que graciosamente retiraram as vendas dos meus olhos e assim, permitindo dar os primeiros passos em direção ao saber e, ao mesmo tempo, revelaram o colorido dessa vida religiosa que antes se apresentava em branco e preto e sem as  dimensões e contrastes. Dos primeiros passos até hoje, a caminhada foi longa e não teria chegado onde  cheguei se não tivesse seres maravilhosos ao meu lado, indicando caminhos e lapidando o Ser que ainda permanece nessa longa e difícil jornada do sacerdócio.


#ficaadica
#exijorespeito
Baba Guido Olo Ajaguna

domingo, 6 de novembro de 2016

ANDANDO NA CONTRAMÃO DA RELIGIÃO.



Não pretendo fazer aqui, a apologia da indisciplina religiosa, nem tão pouco, incentivar o desrespeito às Leis das Religiões. A contramão a que me refiro tem a ver com os sentimentos, os valores, os princípios e as atitudes, que circulam no coração de um religioso.

São as Jornadas Religiosas durante nossa estadia nesse mundo que nos interessa nessa postagem, com seus "engarrafamentos" que impedem o fluxo de nossos sonhos e, muitas vezes, nos obrigam a desviar caminhos que terminam em becos sem saída e muito deles sem volta.

Se percebermos a vida religiosa como uma viagem, é preciso coragem e ousadia para alterar algumas rotas pré-estabelecidas, e para tanto, é necessário aprender a andar na contramão, pelo menos, em algumas ocasiões.

Estamos vivendo a Era da Desilusão, onde a grande maioria da humanidade está “desencantada” com a vida, sobre tudo a vida religiosa; o pessimismo e o negativismo vão dominando os pensamentos, destruindo em muitos a coragem para lutar, andar na contramão é ser otimista.

Hoje, mais que nunca, é preciso cultivar o otimismo; não aceitar o caos como algo já determinado e lutar para alterar as rotas do desânimo e da apatia. As verdadeiras mudanças começam dentro de nós mesmos, e são elas que redesenham os caminhos da nossa existência. 
Outra atitude que vai ao sentido contrário à maioria é a perseverança, isto é, a determinação de continuar lutando. Nós somos a geração das facilidades e das respostas imediatas. O imediatismo influência de tal forma a nossa existência, que o bom, não é mais aquilo pelo qual lutamos, mas o que recebemos pronto e rápido.

Por isso mesmo, por falta de perseverança, muitos dos nossos sonhos vão ficando para trás e as conquistas atuais como: casamento, família, trabalho, etc., correm o risco de serem também destruídos. Sonhar, lutar, persistir, cair, mas jamais ficar prostrado, são virtudes presentes nas biografias de homens e mulheres que viveram, venceram e fizeram a diferença. 

Outra forma de se andar na contramão, é a coragem para ser verdadeiro. Nossa cultura é edificada a partir de muitas contradições, e o “faz de contas” passou a ser algo indispensável no cardápio da sociedade.

Chegamos ao ponto tal, que as pessoas acham que e vergonhoso ser honesto, verdadeiro e transparente. É preciso romper com o tráfego das mentiras, que a “cultura” vem legitimando como o sentido único para a vitória. É preciso bloquear as saídas por meio do suborno, do engano e da ilusão. Seja uma pessoa verdadeira! Tenha orgulho de si mesmo. Não há virtude alguma em viver enganando-se a si mesmo e tentando enganar aos outros. 

Finalmente, andar na contramão, é decidir ser diferente, quando necessário, ainda que, isto implique caminhar no sentido oposto à “mão única” escolhida pela maioria, como por exemplo:

-     Quando todos desistirem continue lutando;
-     Quando todos descrerem exercite a sua fé;
-     Quando todos murmurarem louve a Deus;
-     Quando todos odiarem aprenda a amar;
-     Quando todos mentirem fale só a verdade. 

Enfim, nesta viagem religiosa, os Caminhos de Deus, que sempre conduzem a vitória, à felicidade e à paz, muitas vezes, não seguem roteiros, são percorridos na contramão da história, especialmente quando essa história é marcada pelas rotas da tristeza, da derrota e da destruição.

Por isso, andar na contramão, seria poder também, andar com Deus e com o Sagrado?

Baba Guido Olo Ajguna.


quinta-feira, 3 de novembro de 2016

QUEM EM FOFOCA VIVE DESFOCA NA VIDA!

“O fofocar pode desfocar, porque tira o nosso foco, nos mantém fora das atenções principais da vida”. Faz de aquele momento querer o mal de nossos semelhantes. Quantas coisas na vida foram desfeitas por “palavras venenosas” que trouxeram discórdia e semearam o ódio?
Realmente o “fofocar” existe em todas as esferas da sociedade, muitas vezes maculando e manchando os caminhos por onde passa.
Em minha jornada religiosa tenho me deparado com situações e momentos em que o assunto de certas reuniões nada mais nada menos era falar da vida alheia, ou seja, “fazer fofocas”.
Em simples resumo, podemos definir que o “hábito do mexerico”, muitas vezes nasce do sentimento de injustiça de um determinado individuo, quando surge a inveja do sucesso e crescimento do outro, e segundo sua própria concepção, o mesmo deveria estar desfrutando daquela alegria. Quando alguém está feliz e o outro infeliz, a frustração não demora vir a tona; não se contendo, começa a “detonar” com o outro. Quando a alegria do outro está incomodando, começa a busca pelos defeitos, imperfeições e com certeza uma das coisas mais tristes, o alegrar com a queda do outro e se entristecer com suas vitórias.
Um dito popular diz: “Toda ausência é atrevida”. A ausência é amiga da fofoca e quando o outro não está para se defender é muito fácil dizer o que bem entender.
Tem coisa mais feia do que falar pelas costas coisas negativas, denegrir a imagem do outro?
Em uma colocação muito particular, esse é pior de todos os males, quando matamos a honra, a moral e os princípios da pessoa ausente, sem lhe dar mínima possibilidade de defesa e direito de resposta.
Quem crê no Deus Supremo e no Sagrado, sabe muito bem no “poder da palavra” e que nossa língua foi feita para proferir boas palavras, construir, edificar e não ao contrário.
Temos que nos conscientizar em nos manter afastado dos lábios mentirosos e difamadores não darem ouvidos a palavras que desmoralizam o próximo, não alimentar conversas maliciosas, não propagar “contos da vida alheia”, dos quais dizem respeito somente aos mesmos.
Certa vez uma senhora muito religiosa me disse: que quando nos reunimos para falar da vida alheia, uma energia muito ruim começa a se formar ao nosso redor e essa energia acaba por se plasmar em nosso interior e até mesmo nos batentes das portas, telhados e paredes de onde estamos presentes. Superstição ou não, acredito nisso até os tempos de hoje.
Falar da vida alheia é uma grande perda de tempo, mas parece que tem muita gente que se esquece de sua vida e se importa em gastar seu precioso tempo se interessando na vida dos outros.
Pense nisso, quando for abrir sua boca: Imagine se suas palavras irão “construir ou destruir?”, “edificar ou derrubar?”, “gerar vida ou morte?”.
Se não valer a pena o que vai dizer, o melhor é ficar em silêncio, se não tiver palavras boas não profira palavras más. Retire-se e faça uma prece a Deus, as Divindades, as Deidades, as Entidades, aos Santos ou aos Encantados.
Baba Guido Olo Ajaguna


terça-feira, 11 de outubro de 2016

BABA KÉKERÉ - UM RELATO DE DEVOÇÃO E DECEPÇÃO.



Antes de prosseguir, gostaria de justificar que o intuito dessa postagem tem a finalidade de apenas se tornar de conhecimento público, aquilo que julgo ser a minha verdade.

Recebi o Cargo Religioso de Baba Kékeré (outorgado pelo Santo da Casa) no Terreiro de Candomblé denominado de Àṣẹ Bí Arọ̀, presidido pelo Babalòrìṣà Radamés Mendes Queiroz de Òṣogìyán.



Entretanto, depois de quase 30 anos exercendo a minha função da qual foi designado e também acumulando funções de outros cargos, decide cortar definitivamente os laços com a referida Casa de Candomblé e deixar o meu posto em aberto e disponível para ser ocupado por outra pessoa igual ou melhor que a minha qualificação religiosa.

Existem vários motivos de meu desligamento do Àṣẹ, dos quais seria uma tremenda falta de ética religiosa, enquanto os que seguem abaixo apresentados não traria qualquer constrangimento.

Sempre que possível, ou melhor, na maioria das vezes, estava presente nas funções do Àṣẹ, sem me importar com compromissos familiares e muito menos com o meu companheiro, pois sempre acreditei no provérbio “Por causa do Santo se beija o altar” hoje não acredito mais, pois a vida me mostrou diferente.

No principio, a falta de reconhecimento das funções que ali executava e pelo fato do Senhor Radamés ser o Sumo Sacerdote do Templo, obviamente recebia todos os créditos, onde deixava muito bem claro a todos os visitantes que ali eu era o Kékeré “o pequeno” no sentido pejorativo da palavra. Talvez o dito popular “Vestir a boneca para o outro dançar” encaixe perfeitamente como um quadro figurativo.

Os cânticos puramente Ìnàgò que “levei” e “não ensinei” para o Àṣẹ em nome do Santo da Casa, quem levava os créditos eram Ìyá Cidália de Ìrokò, uma das Ẹ̀gbọ́n mais antigas do Terreiro do Gantois, pois ele dizia a todos que tudo o que ali se cantavam e realizam foram palavras ensinadas por essa Sabia Senhora que hoje descansa em paz aos Pés de Olódùmarè.

As Divindades, Entidades e Deidades que “levei” para o Terreiro do Àṣẹ Bí Arọ̀, vieram da Casa de Candomblé do Pai Muxiala e os méritos foram todos para o Babalòrìṣà Indare, atual dirigente do Terreiro do ba Tayọ́, pois hoje ele afirma que a maioria das entidades que ali estão presentes foram “acomodadas” por esse Grande Senhor (que assim o considero), sendo que nem todas ali presentes foram consagradas e sacramentadas por Baba Indare. Alem de poucas terem vindo da casa do Babalòrìṣà Beto Akijunsun, meu finado irmão de santo e pai de santo do Senhor Radamés.

Poderia relatar todas as Divindades que ali se fazem presentes, sua representação, origem e localização, pois sendo a segunda pessoa da casa tenho esse devido conhecimento, mas considero essa uma atitude imprudente.

Se não bastasse tudo isso, o ilustre Pai de Santo, tenta de toda a forma difamar e denegrir a minha imagem, não importando se a pessoa me conhece ou deixa de me conhecer; todos os meus amigos sem exceção que vão visitá-lo sempre tem uma “história escabrosa” com o meu nome; e assuntos graves que se os mesmos se propuserem a servir de testemunha se tornaria Caso de Justiça e seria causa ganha garantida por calunia e difamação; mas infelizmente não é bem assim que as coisas funcionam.

Seu companheiro José Luis Caldas Oni Sàngó, iniciado e consagrado pelo meu Àṣẹ, antes eu era o melhor Pai de Santo do mundo, hoje não esta mais comigo e não sirvo para absolutamente nada. Ele diz ter sido uma opção dele. Será?

Foram quase três décadas de acontecimentos bons e ruins dentro do Àṣẹ Bí Arọ̀, assim como acontece com muitos outros, não sou e nem serei o ultimo a passar por esse tipo de constrangimento. Mas a questão está na traição, ingratidão e falsidade, são essas que mais ferem o coração e a alma do ser humano, machucam muito mais que palavras.

Se não deu certo não deu, paciência, “temos que aceitar as perdas, assim como aceitamos os ganhos” e que cada qual siga o seu caminho, ele triunfando no Terreiro do Bí Arọ̀ e eu no Terreiro da Casa Grande, mas infelizmente nem todas as pessoas dentro de minha religião são portadoras de boa índole e bom caráter.

Hoje sou considerado pra ele o seu pior inimigo, um inimigo mortal, sendo que eu não o considero dessa forma, mesmo com tantos motivos aparentes, mas de que adiantaria esse mau pensamento? Eu apenas desejo que o mesmo pare de me difamar e caluniar, só isso, nada mais que isso. Não peço reconhecimento algum por parte do Terreiro do Bí Arọ̀, pois seria tarde de mais para isso; o tempo já se passou e não volta mais.

Aqui termino com a frase de um dos filósofos mais sábios desse mundo: “Antes de sair em busca de vingança, cave duas covas” Confúcio – Filósofo Chinês.


Baba Guido Olo Ajaguna

quarta-feira, 27 de julho de 2016

UM CONTO DE CRENÇA E FÉ



“Entendo que se a Fé em algo é inabalável e a intenção é boa, algumas coisas são relevantes, 
mas não deixam de ter a sua real importância”



Um religioso de grande devoção e versado no Culto aos Orixás, certa vez cruzava um rio com seu barco, quando ao passar por uma pequena ilha, ouviu a voz de um homem que muito desajeitado tenta exaltar as suas rezas as Divindades das Águas.

Em seu interior não pode por menos que entristecer o religioso. Como era possível que alguém fosse capaz de entoar tão más aquelas rezas?

Talvez aquele homem, ignorava que as rezas deveriam ser recitadas com a entoação adequada, o ritmo e a musicalidade precisa e com perfeita pronuncia.  

Decidiu então ser generoso e desviando de seu curso, decidiu atracar o barco nessa ilhota, a fim de instruir aquele pobre homem sobre a importância da correta execução das rezas.

Não em vão, o religioso se considerava um grande especialista nas rezas para as Divindades das Águas e aquelas rezas não tinha para ele nenhum segredo.

Quando da chegada, notou que se tratava de um homem maltrapilho de aparência muito tranquila. O religioso, com serena paciência, dedicou algumas horas e instruí-lo minuciosamente aquele indivíduo que a cada momento mostrava efusivas formas de agradecimento ao seu improvisado benfeitor. Mas nunca deixava de mencionar ao religioso “que sempre acreditou e tinha fé na maneira que sempre rezou em toda a sua vida”.

Quando entendeu que por fim que aquele sujeito seria capaz de recitar as rezas com certa solvência se despediu dele, não antes lhe advertir:

“Se lembre muito bem disso meu amigo: o poder dessas rezas em seu correto encantamento permite que um Ser Humano seja capaz de andar sobre as águas” Entretanto eu nunca consegui! indagou o religioso.

Entretanto, havia percorrido apenas alguns metros com seu barco, quando ouviu a voz daquele homem recitar as reza de maneira pior do que antes. “Que desperdício de tempo” disse a si mesmo; há pessoas que são incapazes de aprender nada de nada.

“É religioso! você realmente estava certo” disse o pobre homem. O religioso ao ouvir as palavras deste, voltou-se para trás e viu aquele pobre homem “caminhando sobre as águas”.


Baba Guido Olo Ajaguna

terça-feira, 19 de julho de 2016

ŃYÁÃ LẸ̀ – Vísceras preparadas como alimento as Divindades.






Àṣẹ (ọ)kàn yáãlẹ̀
“O poder do espírito rapidamente faz você forte”

Guisado de Vísceras ou popularmente conhecida por “buchada” entre o povo de santo, está cada vez mais raro de se ver ou mesmo de apreciar essa iguaria da cozinha ritualística dentro uma Casa de Santo, até mesmo as ditas como “tradicionalistas”.

Talvez o trabalho minucioso para se preparar as entranhas de um quadrúpede ofertado a uma Divindade, faça com que suas vísceras sejam “despachadas”, e o escasso tempo disponível da mulher habilitada para tal função, seja poupado.

Na atualidade, quem recebe os intestinos dos animais de “quatro patas”, são os riachos, rios, lagoas e florestas; mas não podemos esquecer as encruzilhadas, terrenos baldios, boca de lobo e até mesmo o coletor de lixo.

Ainda existem aqueles que simplesmente “besuntam os intestinos (ainda com seu interior repleto de fezes), com azeite de dendê” e os colocam no pé da árvore para que Ìyámi Òṣòròngà venha se alimentar deste; sendo que até mesmo o quadrúpede que se oferece as Grandes Mães, os intestinos são limpos, temperados e refogados conforme a tradição e costumes.

Entretanto, para a felicidade de muitos, existem aqueles que mantêm a tradição de preparar um verdadeiro “asun” de dar água na boca e de entrar na fila para comer pelo menos um bocado.

Hoje escrevo esse post com lágrimas nos olhos e coração partido; pois de tanto lutar e brigar por uma tradição que acredito piamente, o destino me pregou uma peça. Mas mesmo sendo vitima da “ironia desse destino”, não tenho coragem de fazer com o meu próximo, aquilo que a mim fizeram, pois estaria indo contra os meus princípios.

Baba Guido Olo Ajaguna

quinta-feira, 14 de julho de 2016

ṢÍRE – Por que o dançamos em sentido anti-horário?




Alguma vez em sua vida, você reparou que ao abrir o registro de uma torneira, se faz em sentido anti-horário? Ou que a fechadura da porta de entrada, faz com que a chave gire em sentido anti-horário? Exatamente isso!

Em meu entendimento, dançamos o ṣíre em sentido anti-horário, com a finalidade de abrir uma espécie de “portal” entre os dois planos de existência, ou seja, Ọ̀run – Plano Espiritual e o Àiyé – Plano Material.

A própria palavra [ṣí] – averbada no Dicionário Yoruba – Português, faz referência a um verbo intransitivo, que significa “abrir, descobrir”. Enquanto que a palavra [re] seria a forma contraída do substantivo [õre] do qual significa “bondade, favor, benevolência”.

A ortografia do idioma ioruba nos permite suprir uma das vogais, quando uma palavra termina em vogal e a próxima palavra se inicia com outra vogal. Então teremos as seguintes escritas [ṣí õre] [ṣí(õ)re] [ṣí’re] [ṣíre].

Entretanto, não posso deixar de mencionar, que a palavra ṣíre não pode ser simplesmente traduzida “ao pé da letra”, mas sim interpretada, de acordo com o discernimento de cada um.

Em uma colocação muito particular, entendo que durante a cerimônia do ṣíre, do qual antecede o ponto culminante de todas as festividades, estamos abrindo uma passagem para descobrirmos e recebermos a magnanimidade, complacência, a transigência, e desta forma, que a benevolência de nossas divindades esteja presente entre nós, naquele momento tão sublime.

Certa vez ouvi uma antiga senhora me dizer: Meu filho, um xirê bem entoado, bem cantado, bem tocado, ali naquela hora, com todo mundo compenetrado, fica mais fácil de Orixá chegar nesse mundo!

Baba Guido Olo Ajagùnà

sábado, 9 de julho de 2016

Ìyámàpò Ìyá Òbo – A Mãe da Vagina



Quem foi que nunca ouviu a expressão “Ela é amapô”?

Um tipo de dialeto entre o povo de santo muito comum, quando pretendem se referir a uma mulher ou mesmo ao seu órgão genital. Na realidade esse termo “amapô” é nada mais que a corruptela do nome Ìyámàpò.


Os Tradicionais Mitos nos revelam que esta Divindade pertence à Sociedade Gẹlẹdẹ /Ẹfẹ e foi a responsável em determinar o local exato da vagina – òbo (a palavra eufêmica seria abẹ́) antes mesmo que Ìyámi Òṣòròngà determina-se o local do útero – inú. 

Guardiã e protetora da Floresta Sagrada de Ọ̀ṣún na Cidade de Oṣogbo é constantemente mencionada nos mitos locais desde a fundação desta.

Também conhecida por seu epíteto Ìyá Òbo – Mãe da Vagina, os descendentes de Oṣogbo, lhe prestam reverência e homenagem durante o Àwon Àjo Àfiyèsí ti Ọ̀ṣún a Festividade Anual.

Sabemos que o útero materno guarda um dos maiores Segredo da Criação e o aparelho reprodutor feminino não esta sob o domínio de apenas uma divindade, como no caso da libido e fluídos corporais que escorrem da vagina estão sob a influência de Ìyámàpò.

Baba Guido Olo Ajagùnà


quinta-feira, 7 de julho de 2016

SAKPATA vs ṢỌPỌNNÁ e outros mistérios perdidos no tempo


Teria Sakpata imigrado para a antiga Nigéria 
ou 
Ṣọpònná imigrado para o antigo Dahomé?

Sakpata entre os Ewe Fon e



Ṣọpònná entre os Iorubas.

Divindades distintas ou a mesma divindade cultuada de formas diferentes?


Visando e primando pela perpetuação do culto as divindades de Panteão Ioruba, exponho neste tópico algumas informações acerca de Sakpata, Ọbalùàiyé, Ọmọlu e Jagun Agbaba, para darmos inicio a um intercâmbio maior sobre o conhecimento desta família da qual a denomino de Iji Jẹpẹtẹwu ou mais conhecida pelo povo de santo como A Família Ji.


SAKPATA

Para um melhor entendimento, deveremos saber que no antigo Dahomé, existe uma divindade no Panteão Ewe Fon, denominada de Sakpata, o Vodun da Varíola... A etnia Ewe Fon e conhecida popularmente no Brasil pelo término Jeje e em Cuba por Arara... Da mesma forma que Ṣọpònná seu nome não pode ser pronunciado, seus adeptos o preferem chamá-lo de Ayinon “O dono da terra”... Sakpata pertence a primeira linhagem da família de Nyohwe Ananu uma Vodun que possui característica idênticas as de NàNá Burúkú... Os nomes mais conhecidos de Sakpata no Novo Mundo são Azontunu e Avimage... Segundo reza a tradição, um grupo expedicionário da região de Savalou que estavam ao norte do antigo Dahomé, encontrou os Kadjanu (nagôs vindos da região de Badagris) em Damé, as margens do rio Wèmé, os quais o seguiram até Savalou, levando com eles sua divindade protetora dos quais denominaram em língua Fon de Sakpata Agbosu... Em Savé, afirma-se que Ṣọpònná teria vindo do reino de Ọ́yọ́... Essa remota origem nagô-iorubá é sublinhada pelo fato de que os Vodunsi (iniciados) de Sakpata são denominados Anagonu, que significa forasteiro de onde se originou a corruptela nagô... Em Dassa Zoumé, Ṣọpònná é conhecido por Sakpata... Os Sakpatanon grã-sacerdotes do Culto à Sakpata tinham uma grande influência sobre a realeza, porém, os reis jamais tiveram muita estima pelos sacerdotes desse culto. O mesmo culto passou por momentos de aceitação e reprovação; foi restabelecido por várias vezes e em seguida proscrito formalmente, pelos soberanos do reino do Dahomé, da mesma forma que os Oluwo Ipopo, os Sakpatanon foram mortos e muitos expulsos do território do Benim.

ṢỌPỌNNÁ

Entre os iorubas Ṣọpònná é temível e perigoso, divindade das epidemias, sobretudo a varíola, sua maior arma de punição aos malfeitores e aqueles que o desrespeitam. As altas temperaturas corpórea, seguidas de delírios causados pela infecção de doenças contagiosas, não são mais do que sintomas da ira de Ṣọpònná contra sua vitima. Quando temos alguma razão para pensar que um enfermo esteja sob a manifestação maléfica de Ṣọpònná é descrito de Ilẹ̀gbóná – Varíola; Ìgbóná – Febre ou até mesmo Ilẹ̀ gbígbóná – Terra quente, ou seja, “a terra aonde o enfermo encontrasse está demasiadamente quente” é a presença do Deus da Varíola e precisa ser apaziguado. Neste caso os iorubas não pronunciam mais o nome Ilẹ̀ gbígbóná e sim empregam um eufemismo e dizem exatamente o contrário Ilẹ̀ Tútù – O solo está frio, vertendo água de dentro para fora da casa. Terrivelmente temido, seu nome não deve ser pronunciado, sobre tudo perante aos enfermos, quando invocado é mais indicado usar nomes com expressões adulatórias, como: Ọbalùàiyé – Rei e Senhor da terra; Olùàiyé – Senhor da terra ou Oloòde – Senhor dos espaços abertos. Quando um enfermo padece de qualquer doença contagiosa e se crê que a causa seja Ṣọpònná os iorubás descrevem a situação em términos de profundo respeito a divindade. Eles dizem Ó n sin ba – Ele está sob a vontade do Rei; Ilẹ̀ gbígbóná n bá a jà – A terra quente há posto sua mão sobre ele ou a terra quente o está afetando; Ó gb' ofá ou Ofá bà á – Ele atinge sua vítima como uma flecha ou Ele foi atingido por uma flecha. Ṣọpònná é descrito como Alápó – Alguém que maneja o temor e quando um enfermo morre como resultado de sua aflições, usualmente não se diz Ó kú – Ele morreu, se diz ba mú nlọ́ – O rei o o levou ou ainda Ilẹ̀ gbígbóná gbé e lọ́ – A terra quente o levou. Os mitos relatam que em dia de sol escaldante, em especial ao meio-dia, Ṣọpònná está vagando por todos os lugares e comumente se alerta a não usar o vermelho ao “sol a pino” correndo o risco de insultá-lo, do qual teriam sérias conseqüências. Deve-se ter cuidado, especialmente durante a temporada de seca, de não fazer nada que o ofenda, A sòroó pè léèrùn – Alguém cujo nome não é propicio se chamar durante a época de seca. Os antigos entendem desta forma porque as maiorias das epidemias de varíola foram constatadas em épocas de seca, além de que os iorubas crêem que Ṣọpònná esteja nessa época particularmente ativo. Ṣọpònná é considerado feroz e muitas vezes implacável, então não insultá-lo é a melhor prevenção de não ser molestado por uma divindade tão perigosa.

Ṣọpònná é a única divindade de que sua vontade, qualquer que seja sua manifestação, deve ser aceita, não somente com resignação senão com uma manifestação de prazer e gratidão. Por exemplo, os parentes de alguém que morre de varíola não deve se lamentar o mostrar que choram pela morte de um ente querido. Em vez disto eles devem estar alegres e felizes e mostrar que estão amplamente agradecidos pela atitude do Rei da Terra. Assim, Ṣọpònná é conhecido por Alápadúpé – Alguém que mata e se agradece por isso.

Sob seu absoluto domínio está a crosta terrestre; o solo onde o homem habita, constrói, cultiva e deposita seu cadáver após a morte; ele nutre os homens dando-lhes o milho e outros grãos do solo, mas também os pune fazendo com que, através de suas peles, saiam os “grãos” que eles comeram. Filho primogênito de Nà Bùkùú ou mais conhecida no Panteão Ioruba de NàNá Burúkú. Seu maior companheiro, um ancestral denominado de Ãle que habita o lado de fora de sua casa; nada o faz sem antes prestar reverencia a ele; seu nome não deve ser pronunciado após o pôr do sol. Na crença ioruba Ṣọpònná é a “Destruição que surgiu em uma noite”.

A escassez de informações sobre a origem do culto o mantém na obscuridade. Isso ocorreu devido ao fato deste culto ser de caráter reservado e em épocas remotas era proibido falar sobre o assunto. Acreditasse que se trata de uma divindade estrangeira, agregada ao Panteão dos Iorubas ou do retorno de origem ioruba longínqua, levadas por uma das inúmeras migrações em direção ao oeste da Nigéria e imigrações ao país vizinho a Republica Federal do Benim, antigo Dahomé. Ao pouco que se sabem, os antigos iorubas citam que Ṣọpònná teria vindo do território Fon e outros que tenha retornado a suas terras de origem, o território Iorubá... Na Cidade de Ketou há divergência de opiniões quanto a origem de Ṣọpònná... Alguns acreditam que tenha vindo a Ketou de Dassa Zoumé, segundo alguns, de Adja Popo, segundo outros, de Aise e uma terceira opinião de Holi... Para um melhor esclarecimento, as maiorias dos estudiosos afirmam que o Culto ao Deus da Varíola, tenha sido oriundo do Leste Ioruba.

A Medicina Tradicional de se curar a varíola denominado de Ẹ̀rọ ou Oògùn Ṣọpònná era conhecido, entre os iorubas, unicamente pelos sacerdotes de Ṣọpònná, que fizeram dele grande comércio e elevaram a varíola à posição de uma divindade temível. Na qualidade de representantes do “senhor e rei da terra”, os corpos e os bens das vítimas pertenciam de direito aos sacerdotes de Ṣọpònná. Esses sacerdotes mantinham em suas casas, cabaças com parte dos cadáveres da vítima da varíola, tais como um braço ou pé; potes contendo um líquido escuro, feito com a água extraída do cadáver ou da água que serviu para lavar o corpo, enquanto a pessoa estava viva; recipientes com um pó escuro, proveniente das escamações secas, deixadas pela varíola. Essa água ou esse pó eram jogados, durante a noite, na frente da casa das pessoas a quem se quer infectar. Os moradores ao saírem de casa, entravam em contato com os germes. Assim que uma ou mais pessoas da família se contaminasse, a erupção da pele aparece e um sacerdote de Ṣọpònná é convocado. Durante o tratamento Ẹ̀bẹ̀ – súplicas, preces eram constantemente recitadas com a finalidade de propiciar e apaziguar a fúria de Ṣọpònná.

De dez sacerdotes do culto, nove ajudam mais a desenvolver a doença do que interrompê-la. Era de seu interesse agir assim, além de grandes somas que recebem, eles reivindica todos os bens do doente, caso esse venha a falecer. Esses sacerdotes inescrupulosos retiravam os cadáveres da casa, mas não o enterravam no bosque com de costume, a não ser jogá-los no mato, onde os porcos os comiam e, algumas vezes, os pedaços do corpo eram levados para as aldeias vizinhas, contribuindo para espalhar o mal. Assim os sacerdotes faziam negócios muito lucrativos. Os sacerdotes que procediam de maneira correta conduziam o enfermo ao templo de Ṣọpònná e lá os sacerdotes os lavam com areia de praia quente e remédios secretos.

A História dos Iorubas em meados do século XVIII relata que um surto de epidemia da varíola dizimou a população de Abeokuta. Centenas de pessoas morriam todos os dias, metade da população fora atingida. Os governantes locais realizam uma sessão e certo número de adeptos de Ṣọpònná foram executados e outros expulsos, e suas casas incendiadas.

MLULU RGBO

Divindade que se funde ao culto de Ṣọpònná, mas em muitas localidades não se confunde. A região de Kétou, cidade fronteira entre a Nigéria e o Benim, é a única região em todo o território ioruba onde Ọbalùàiyé e Ọmọlu são considerados, ao que parece, como uma única divindade... Seu templo é separado de sua mãe mítica NàNá Burúkú... Com essa mesma característica ele é conhecido no Brasil, onde a influência Kétou é muito grande entre os descendentes de escravos que para lá foram levados. Em Ile Ife não existe culto à Ọmọlu e muitos ali o desconhecem. Contrário na região Mahi, onde seu culto se destinge totalmente de Ọbalùàiyé. Ao que se sabe, seu culto se originou do Oeste Iorubá.

A tradição local da Cidade de Topli, no Togo, Ọmọlulu rgbo é considerado uma divindade feminina, que saiu das águas segurando um aara emblema ritualístico e em uma das mãos e um gbada – facão na outra. Este facão é uma representação do crocodilo, animal sagrado entre as divindades dos rios... Em Abeokuta Ọmọlu é considerado um Òrìà feminino, onde o Culto à Ṣọpònná esta proibido desde 1884, divide seu templo com NàNá Burúkú e a ambas as divindade, quando se oferece sacrifícios de animais não se utilizam de facas... É possível que existam duas divindades com o mesmo nome, um de cada sexo, conforme se verá... Na cidade de Abeokuta, Ọmọlu é chamado de Olù Odò Senhor do riacho (água) e Ọmọlu Òrìà omi ni – Ọmọlu é uma divindade das águas... Esse riacho é conhecido com Odomọlu o riacho de Ọmọlu e esta localizada em direção ao poente.

De suma importância mencionar, que o Templo de NàNá Burúkú esta voltado em direção ao poente e neste são realizados as oferendas somente ao por do sol, da mesma forma que se pratica nos Terreiros Tradicionais da Bahia.
 Na Cidade de Aise, existe em seu templo uma grande lança esculpida, denominada de Ọkọ Ọmọlu, na qual são representados por três personagens superpostos, representando Òumare, o próprio Ọmọlu e Iroko... Em Dassa Zoumé Ọmọlu é duplo, masculino segurando um facão e feminino segurando um abẹ́bẹ̀ – leque e um irùkẹ̀rẹ̀ – ornamento de cauda de bovino. Seu culto foi trazido de Aja Aguna e agregado em Dassa Zoumé na época do Rei Onigbo – quarto soberano de Dassa Zoumé...

Nas proximidades de Atakpamé, cidade do Togo onde existe um dos principais templos de NàNá Burúkú, em uma aldeia igualmente chamada de Adja Agouna, existe um templo dedicado à Ọmọlu Arawe uma divindade masculina... em outra aldeia da região, conhecida por Gbekon, encontra-se um templo de sua contrapartida feminina, denominada de Ọmọlu Idji Aguna... Nesta região ambos os Ọmọlu são divindades totalmente distintas de Ṣọpònná e o sacrifícios de animais à Ọmọlu Arawe e Ọmọlu Idji Aguna são realizados sem que se utilize uma faca para imolar o animal. Seus interditos são o vinho de palmeira no que se diferencia de Ọbalùàiyé onde é ofertado este tipo de vinho...

AJAGUN AGBAGBA

Ajagun ou simplesmente Jagun é uma divindade guerreira, originário de Ekiti Ifòn, pois acreditasse que sejam filhos de um dos Òrìà Funfun. Ao que se sabe é considerado um Guerreiro Branco... Considerado invencíveis, por sua bravura e coragem, nunca perdeu uma batalha, o que lhe deu o título de Keledjegbe – O Guerreiro Invencível. Ajagun se refugiou na Cidade de Ijena, terras do temível Ṣọpònná, onde passa a ser agregado à família de Ọbalùàiyé tornando-se um dos Guardiões do Culto do Deus da Varíola.

Importante mencionar que a cidade ioruba Ijena ou Jena foi fronteira com o antigo Dahomé e outrora um dos grandes centros de contacto e aculturação entre duas das maiorias etnias da África os Ewe-Fon e os Yorubá.

Em território ioruba o descrevem segurando uma lança – kọ̀ em uma das mãos e um facão – gbada na outra. Sua cor predominante é o branco e seus interditos são o vinho de palmeira, cabe ressaltar que o vinho de palma é tabu para todas as divindades da família de Òrìà-Nlá.

CONCLUSÕES

Não poderia nos tempos de hoje chegar a uma conclusão definitiva a não ser a maiores questionamentos, sobre esses diversos aspectos de Ọbalùàiyé, Ọmọlu e Jagun Agbaba:

Duas divindades de origem diferente e pertencentes a antigos grupos culturais diferentes, divindades essas que vieram uma do leste (Ṣọpònná) e outro do Oeste (Ọmọlu), unindo e assumindo um caráter único em Ketou ?

Trata-se de uma divindade única, de origem ioruba e de origem Tapa (Nupe) mais longínqua, trazida para o oeste por uma das numerosas e antigas migrações que as tradições mencionam, e do retorno, em seguida, dessa divindade para seu ponto de partida, trazendo um novo nome, que originalmente, não passava de simples epíteto ?

Seria Ọmọlu Idji Aguna divindade feminina que saiu das águas a conhecida Yyógbáyin já que a ambos não se realizam sacrifícios com faca?

E quanto a Jagun, seria este Ọmọlu Arawe divindade masculina, baseando-se pelo fato de ambos portarem um facão em uma de suas mãos?

A grande lança na entrada do Templo de Ọmọlu Arawe na Cidade de Aise, não poderia ser a lança de Jagun?

Existem muitos mistérios em nossa sagrada religião que jamais serão revelados. Sem ser pretensioso, às vezes penso que nossa religião precisasse das “Areias do Tempo” a mítica ampulheta que permitia viajar pelo tempo. Mas isso está longe de nós pobres mortais.


Baba Guido Olo Ajagùnà

A SAGRADA CERIMÔNIA DE PURIFICAÇÃO NAS ÁGUAS



Elemento de suma importância,
a água é o princípio da vida”.



A água é considerada o símbolo da purificação na maioria das religiões, incluindo o Hinduísmo, Cristianismo, Judaísmo, Islamismo, Xintoísmo e Wicca. Os ritos de “batismos” nas mais diversos seguimentos religiosos, são praticado na água; esta simboliza o “rito de nascimento” de um novo ser, a passagem para a vida religiosa, pois as maiores partes das culturas consideram a água a “canal que nos conecta com a espiritualidade”.

Nesse new post, focaremos apenas nas religiões de matrizes africanas, sobretudo nos descendentes dos Iorubas no Novo Mundo.

No Brasil ou em Cuba, assim como do outro lado do Atlântico na “Mãe África”, as mais diversas cerimônias de purificação dos noviços realizados nas águas, antecedem todos e quaisquer ritos de iniciação. Sabemos que os ritos as divindades do panteão africano são regionais e diferem de um local para outro; mas em seu contexto religioso tem uma única finalidade: a de purificar, harmonizar, energizar nosso corpo; ainda acrescento “defender nosso corpo de energias nocivas. Enfim uma cerimônia que tem como principal finalidade a de levar embora o que não tem mais serventia para a nossa nova vida religiosa”.

Em território iorubano esta ritualística tem a denominação de Anlodò e Pierre Fatumbi Verger em sua celebre obra ORIXÁDeuses Iorubás na África e no Novo Mundo a descreve da seguinte forma:
Cedo pela manhã, realiza-se o que se chama Anlodò “vamos ao riacho”, quando os noviços, homens e mulheres, saem do Igbo. Eles caminham, um atrás do outro, no estado de entorpecimento do qual falamos anteriormente. Um grande pano branco àlà, é mantido sobre suas cabeças; estão todos vestidos de panos esfarrapados e entram no recinto consagrado a Xangô, onde cada um deles recebe uma jarra contendo infusão de folhas dedicadas ao Orixá. Quando saem dali Ìyá àngó e algumas iniciadas já antigas sobre a cabeça dos futuros elégùn uma rodilha de fibras, usadas na África como esponjas vegetais. Em cada uma dessas rodilhas foram presos uma fileira de búzios e um pintainho de alguns dias, amarrado pelos pés. As jarras são colocadas por cima Ìyá àngó e suas ajudantes. Elas tem o cuidado de colocá-las três vezes seguidas, antes de deixá-las ali. A fila de noviços forma-se de novo e dirige-se, acompanhada pelas mulheres encarregadas da iniciação e por um conjunto formado de atabaques bàtá ou de cabaças agbè. Esse pequeno grupo dirige-se a um riacho, ou uma lagoa, situado no meio de uma floresta sagrada da vizinhança. Os noviços vão com o corpo inclinado para frente e a cabeça levantada para manter o equilíbrio da jarra. Caminham dançando, seguindo o ritmo dos atabaques, e de vez em quando esboçam alguns passos mais firmes, com os joelhos dobrados. Muitas vezes, um elégùn de Exu precede o cortejo para que nada de desagradável aconteça. As iniciadoras e os noviços são os únicos a penetrarem na floresta. Os músicos e as pessoas da escola param e esperam na proximidade. À beira do rio, ou da lagoa, fora construída uma pequena cabana de folhas de palmeiras. No centro, fora cavado um buraco e coberto com alguns galhos, formando uma grade. A terra retirada da escavação fora deixada ao lado, em forma de montículo. Cada noviço deve ficar em pé um após outro, em cima da grade improvisada sobre o buraco, e a jarra é colocada em cima do montículo. O iniciado é então despido e seus trapos são jogados no fundo do buraco. Seu corpo é lavado com água contida na jarra e esfregado com a rodilha os búzios e o pintainho, que, não resistindo a esse tratamento, não demora a morrer. Tudo isso é depois jogado no buraco. A operação consiste, ao mesmo tempo, num sacrifício de substituição e de purificação das faltas que tivessem podido, manchar o passado dos noviços. Assim, uma vez purificado, seu corpo é enxaguado com a água do riacho e vestido com um pano branco. Colocam-lhe na cabeça uma nova rodilha e a jarra contendo agora água do riacho. Quando o último dos noviços terminarem essa obrigação, tornam a fechar, socando a terra com os pés. O abandono das roupas velhas, substituídas pelos novos panos brancos, é um símbolo da rejeição do passado e da passagem para uma visa nova e dedicada ao Orixá.

Lidia Cabrera em sua magnifica obra IEMANJÁ & OXUM – Iniciações, Ialorixás e Olorixás denomina a cerimônia de purificação no rio de wo ti omorisha luwe odo e a descreve em ricos detalhes:

Efetuando o ebo de entrada, na hora em que o Sol vai se pôr, leva-se o omó-orixá ao rio. Em alguns ilês, prefere-se a noite ao entardecer e a purificação por meio da água viva se pratica à luz da lua ou das estrelas. Ela é conduzida pela ajibonã, segunda madrinha de assentamento, assistente da iyaré ou, caso se preferir, “a criada do santo”. Ela foi escolhida e aceita pelo orixá para este ofício de maior responsabilidade e a ela se confia o cuidado do neófito até o momento em que, já consagrado, convertido em iaô - “com santo feito” -, ele regressa a sua própria casa, levando para ela suas pedras sacramentadas, nas quais, por virtude dos ritos, se fixou um orixá em cada uma delas. A ajibonã, que além do mais será responsável por tudo aquilo que diz respeito ao lugar em que se concentrarão as forças sagradas, pelo quarto, pelo igbodu, agora vai começar a exercer funções: acompanhada de, pelo menos, duas das ialorixás mais velas, conduz a neófita ao rio. Sem “saudar”, prestar homenagem à dona do rio, sem purificar-se em suas águas, não se efetua assentamento algum. O neófito costuma levar a Oxum um pequeno caldeirão com ochinchín, um de seus pratos prediletos e outras oferendas alimentícias, igualmente gratas à deusa. Paga-lhe um direito que em Cuba, na castiça província de Matanzas, era de cinco centavos. Em seguida ele se moyuba. De yuba – prestar respeitos – criaram os crioulos o termo moyubar.

Ochun yeye mi ogo mi gbogbo ibu laiye nigo gbogbo omorisha lowe mo to si gba ma abukon ni. Omi didume nitosi omi Alafia atiyo obirin elere ache wawo atire maru acho gele nitori yo Ayaba ewa ko eleri rire atiyo. Betonicho nitosi komo nigbati wa ibulu obirin iku oko Olofi odukue.

Após saudar Oxum e explicar à ajibonã os motivos pelos quais esse omo vai assentar-se, a noviça deposita a oferenda no rio. Despojam-na de suas roupas, rasgando-as em seu próprio corpo e ela fica inteiramente nua. Os babalorixás de ocuparão do banho dos neófitos. Assistida por outras ialorixás, que presenciam o banho lustral, implorando para a futura esposa mística a proteção da deusa do rio, a jibonã dá-lhe um banho: lava cuidadosamente sua cabeça com sabão, esfrega-a, passa uma bucha em todo o seu corpo, envolvendo-a em seguida numa toalha nova e seca. A roupa, agora em frangalhos, as meias, os sapatos, a bucha e o sabão são abandonados na corrente. A toalha é guardada. Para essa purificação escolhe-se um lugar do rio em que a correnteza seja forte, levando os “despojos”. Vestida com roupas limpas, a noviça regressa ao ilê levando uma bilha de barro cheia de água. A iyaré a recebe tocando o agogô, a sineta de Obatalá, de forma curva e som mais abafado que o do adjá com que invoca Oxum e Iemanjá. “O agogô faz tan, tan, e o adjá faz, tlin tlin.” Se a pessoa que se assentar estiver muito doente e o objetivo de sua iniciação for recuperar a saúde, ela será dispensada do banho no rio, mas irá saudá-lo, acompanhada da iyaré e da ajibonã, e nele depositará a oferenda e o direito. No caso de doença grave, cumpri esse requisito irrecusável fica a critério da iyaré, que se guiará por aquilo que os deuses disponham. Com a água que a noviça leva do rio, a ajibonã a banhará em casa. É costume, em alguns ilê, não banhar os neófitos no rio estes vão fazer-lhe oferendas e recolher a água com que, em seguida, serão lavados. Em Matanzas, leva-se ao rio a pedra do orixá tutelar, que será consagrada ao omó. Ali chegando, a iá lhe pergunta:

o    O que você veio fazer aqui?
o    Buscar o santo.
o    Que santo?
o    Iemanjá ou Oxum.
o    Pois busque e jogue a pedra, de modo que a encontre sem dificuldade.


A pedra é introduzida na bilha e levada para a casa. Sempre se recolhe a pedra no rio, que se leva dentro da pequena bilha. É costume da ajibonã, ao oficiar no rio, ascender uma vela para proteger-se. “Para dar cobertura ao passo”, como costumam dizer. Afastar o mal.



Dentro dos ritos afro-brasileiros, a cerimônia de purificação no rio, denominada entre o Povo-de-Ketou de Balùw assemelha-se com os ritos de matriz e do afro-cubano. Importante ressaltar que a palavra Balùw esta averbada nos dicionários Iorubá-Português com a tradução de “banheiro”, mas não os locais aonde fazem nossas necessidades fisiológicas e sim aonde nos lavamos. Em alguns Terreiros esse “recinto sem porta e sem telhado” esta localizado próximo a uma fonte ou poço artesiano e inúmeras vezes ouvi dos mais velhos chamar esse local de ZáKá

Essa cerimônia diverge muito de uma linhagem a outra conforme os costumes da família-de-santo. Citarei alguns pontos, dos quais julgo necessário para uma melhor compreensão das mais variáveis formas de se realizar um mesmo ritual, que tem como finalidade única a de purificar o futuro iniciado.
o    Algumas ramas preferem realizar esse rito durante o dia, enquanto outras a noite...
o    Os locais são os mais variáveis possíveis, ou seja, poços artesianos, fontes, nascentes, rios, lagoas e cachoeiras...
o    Raros são aqueles que pagam tributos as divindades das águas...
o    Alguns preferem “despachar” as roupas rasgadas enquanto outros a recolhem novamente para ser utilizadas em determinado momento dos ritos de iniciação...
o    A cuia para banhar, o sabão para lavar e a bucha vegetal para esfregar o corpo da noviça são utilizadas entre as mais diversas linhagens quase que universalmente...
o    Entretanto os ingredientes utilizados no rito são mais elaborados do que outras, tais como ovo-de-galinha, quiabo, milho de canjica cozido, acaça, o pintinho e a folha-do-nativo...
o    Em algumas ramas a noviça poderá deixar parte de seu cabelo nas águas, ao contrário de outros que realizam esse ato somente dentro do quarto-da-iniciação...
o    A volta da noviça ao Terreiro envolto em lençol imaculado e carregando em sua cabeça um recipiente cheio de água natural é hábito na maioria das famílias-de-santo...
o    Trazer uma pedra ou o seixo do rio para “assentar” a divindade tutelar é raríssimo entre o povo-de-santo aquele que executam esse ato...
o    Ainda acrescento que muito dos Baba e Iyalòrìà realizam essa cerimônia em silêncio enquanto outros entoam uma série de cânticos específicos para o rito do Balùw...






Durante a procissão dos ritos das Águas de Oxalá ou Àwon Omi Òàlà o ato de depositar água da fonte ou do poço, sobre os assentamentos de Òàlà  tem precisamente o significado de iniciar e propiciar um novo ciclo. Sem adentrarmos nesse assunto, não que não seja do meu interesse, mas estaria desviando o assunto do tópico em questão. Ainda acrescento que as Águas de Oxalá iniciam o ano litúrgico da maioria dos Terreiros da Bahia. 

Não posso deixar de mencionar que em meu conhecimento e entendimento, os descendentes de africanos no Novo Mundo delegaram “territórios aquáticos” sob domínio de outras divindades e não somente de Ọ̀ṣun
A exemplo da fonte, nascente ou olho d'água dois quais pertencem aos Òrìà Funfun

o poço que nos dá acesso ao lençol d'água subterrâneo esta sob o domínio de Òàlà e Ọ̀ṣun Ìyá Omi Ibu

o percurso do rio pertence à Ọ̀ṣun e Erinl

as quedas d'água ou as cachoeiras são regidas por Òumare;

assim como a loca, as águas dentro de grutas e cavernas, pertencem a Yéwà

os charcos, banhados, poças d'água, pântanos e brejos pertencem à família de Nàná

as lagoas e as águas represadas pertencem as Ọlọ́ọ̀sà e a Otin

no encontro das águas doces com a água salgada denominada de "pororoca" esta sob o domínio de toda as Divindades Fluviais e o oceano sob a proteção de Olóòkun e alguns Ọ̀batalá que em sua essência são femininos.

Meus humildes respeitos aqueles que não realizam de forma alguma esta “sagrada cerimônia”, pois a considero de suma importância dentro de nossa religião, pois em meu entendimento as “Águas de Ọ̀ṣun” contem em sua essência, poderes curativos, adivinhatórios, protetores, purificadores e acima de tudo o mistério da fertilidade. Essa cerimônia representa a renovação, o renascimento para uma nova vida, revitaliza a conexão espiritual entre o futuro iniciado e suas divindades. Ọ̀ṣun é a divindade que representa o poder da Mãe para salvar seus filhos, que com seus poderes, permite purificar internamente aqueles que a ela recorrem. Por isso não há nenhuma cerimônia na religião Iorubá que não requeira a passagem de um iniciado pela águas de um rio.
Espero que de alguma forma tenha esclarecido o complexo “mundo das águas” das quais as divindades femininas são em maior numero de tutoras, Em outras palavras a água pertence ao elemento natural feminino, não somente dentro de nosso culto, mas em toda a vida, pois verter água sobre a terra significa não só fecundá-la, mas também restituir-lhe com seu sangue branco com o qual ela alimenta e propicia tudo que nasce e cresce.
Baba Guido Olo Ajagùnà